O purgatório
Ela se chamava Laura, 26 anos, protestante, calvinista, capitalista, materialista, egoísta e egocêntrica. Sua Generosidade limita-se ao pagamente frio, superficial e irritante da comissão espiritual do seu pastor. Um imposto social, para ser vista com bons olhos na sociedade. Apesar de sua avareza, sua característica mais marcante era a vaidade.
Ascendência francesa, seus genes lhe foram generosos, concedendo-lhe um corpo gracioso e uma beleza ímpar. Ela só era desprovida de seios, e para saciar sua voracidade especular, submeteu-se à cirurgia plástica.
Na mesa de cirurgia, atordoada pelas forças mágicas da anestesia, ela sentiu seu corpo extremamente leve, pairando no ar e subindo até o teto da sala, onde viu na mesa de cirurgia o seu corpo sendo dilacerado pelos médicos, que mais pareciam açougueiros. Teve asco.
De repente ela sentiu novamente a força da gravidade, despencando rapidamente no instante de um susto indo de encontro com o chão, mas para sua surpresa, ela atravessou o chão e o medo como se fossem uma parede de gás à sua frente. Parou de sentir medo. Queda livre em direção ao desconhecido.
Após um indeterminado tempo ela caiu numa galeria com estalagmites e estalactites acobreadas. Sem dor, levantou-se, tentou tirar a poeira que não havia, e então percebeu que estava diante de um grande portão de aço, um aço rubro, com uma inscrição que contradizia suas crenças, esculpida em letras grandes e arcaicas: Purgatório.
O portão se abriu, autônomo. Tomada de uma mórbida curiosidade, Laura foi caminhando até o portão. Caminhou e atravessou um grande corredor que foi desaguar num enorme salão, suntuoso e extremamente mal iluminado, onde quase não dava para se situar. A única luz que clareava aquele breu vinha de uma porta de madeira muito simples, entreaberta no canto da sala. Foi atrás da porta.
Chegando mais perto, começou a ouvir alguns gemidos indefiníveis. Abriu a porta com o coração acelerado, suando um suor frio que não existia, mas com uma ansiedade que não somente existia como também era absoluta e a dominava.
Abriu-a de uma só vez, num só bruto ato. Uma sala apertada, uma mesa enorme, várias cadeiras requintadas, um impressionante banquete com as comidas mais suculentas que ela já viu na vida num espetáculo de sinestesia.
E sentados às mesas, desespero e agonia envultados, imitações de pessoas. Gritos e urros ensurdecedores, veias saltando às gargantas. Uma situação desesperadora e ensandecida. Os braços e punhos estavam acorrentados, impedindo-lhes de levar seu próprio alimento a boca. A fome fazia com que o tempo lá não passasse, e as almas condenadas ficassem até durante séculos naquela situação.
Laura correu, transtornada, da sala e voltou correndo para o saguão, que de repente se iluminou num instalar de dedos, revelando toda a suntuosidade que havia sido encoberta pelas sombras. Uma abóboda alta, com colunas e reentrâncias com entalhes de fina madeira, mármore, ouro e pedras preciosas, com afrescos renascentistas grandiosos, no teto e nas paredes, que causariam inveja ao próprio Michelângelo.
Só então ela se deu conta que aquela porta da sala dos acorrentados ficava nas extremidades escondidas daquele saguão, e que em seu centro pairava um enorme portão que se erguia até quase o teto, revestido de ouro e vinhas barrocas douradas, mas vivas, com um forte ar celestial. O portão se abriu, novamente, causando um som grave e imponente, mostrando seu interior.
Onde antes as paredes apertadas sufocavam os condenados, o que limitava a sua amplitude eram as nuvens numa luminosidade solar de fim de tarde. Via-se o Sol, pintando as nuvens no horizonte, e o mar multicor, olhando-se muito profundamente, aos seus pés. Literalmente não andando com os pés no chão. A mesma mesa com o mesmo banquete, as mesmas cadeiras, as mesmas correntes, mas sentados as mesas, não mais os vultos enlouquecidos de fome, mas sim a pura representação da felicidade.
Cada um alimentava a pessoa sentada ao lado, contornando de forma altruísta os limites impostos pelas correntes, que agora nem se faziam mais precisas, e se afrouxaram ao ponto de libertar-lhes os punhos.
Laura então sentiu seus peitos dilatados e doloridos.
Ascendência francesa, seus genes lhe foram generosos, concedendo-lhe um corpo gracioso e uma beleza ímpar. Ela só era desprovida de seios, e para saciar sua voracidade especular, submeteu-se à cirurgia plástica.
Na mesa de cirurgia, atordoada pelas forças mágicas da anestesia, ela sentiu seu corpo extremamente leve, pairando no ar e subindo até o teto da sala, onde viu na mesa de cirurgia o seu corpo sendo dilacerado pelos médicos, que mais pareciam açougueiros. Teve asco.
De repente ela sentiu novamente a força da gravidade, despencando rapidamente no instante de um susto indo de encontro com o chão, mas para sua surpresa, ela atravessou o chão e o medo como se fossem uma parede de gás à sua frente. Parou de sentir medo. Queda livre em direção ao desconhecido.
Após um indeterminado tempo ela caiu numa galeria com estalagmites e estalactites acobreadas. Sem dor, levantou-se, tentou tirar a poeira que não havia, e então percebeu que estava diante de um grande portão de aço, um aço rubro, com uma inscrição que contradizia suas crenças, esculpida em letras grandes e arcaicas: Purgatório.
O portão se abriu, autônomo. Tomada de uma mórbida curiosidade, Laura foi caminhando até o portão. Caminhou e atravessou um grande corredor que foi desaguar num enorme salão, suntuoso e extremamente mal iluminado, onde quase não dava para se situar. A única luz que clareava aquele breu vinha de uma porta de madeira muito simples, entreaberta no canto da sala. Foi atrás da porta.
Chegando mais perto, começou a ouvir alguns gemidos indefiníveis. Abriu a porta com o coração acelerado, suando um suor frio que não existia, mas com uma ansiedade que não somente existia como também era absoluta e a dominava.
Abriu-a de uma só vez, num só bruto ato. Uma sala apertada, uma mesa enorme, várias cadeiras requintadas, um impressionante banquete com as comidas mais suculentas que ela já viu na vida num espetáculo de sinestesia.
E sentados às mesas, desespero e agonia envultados, imitações de pessoas. Gritos e urros ensurdecedores, veias saltando às gargantas. Uma situação desesperadora e ensandecida. Os braços e punhos estavam acorrentados, impedindo-lhes de levar seu próprio alimento a boca. A fome fazia com que o tempo lá não passasse, e as almas condenadas ficassem até durante séculos naquela situação.
Laura correu, transtornada, da sala e voltou correndo para o saguão, que de repente se iluminou num instalar de dedos, revelando toda a suntuosidade que havia sido encoberta pelas sombras. Uma abóboda alta, com colunas e reentrâncias com entalhes de fina madeira, mármore, ouro e pedras preciosas, com afrescos renascentistas grandiosos, no teto e nas paredes, que causariam inveja ao próprio Michelângelo.
Só então ela se deu conta que aquela porta da sala dos acorrentados ficava nas extremidades escondidas daquele saguão, e que em seu centro pairava um enorme portão que se erguia até quase o teto, revestido de ouro e vinhas barrocas douradas, mas vivas, com um forte ar celestial. O portão se abriu, novamente, causando um som grave e imponente, mostrando seu interior.
Onde antes as paredes apertadas sufocavam os condenados, o que limitava a sua amplitude eram as nuvens numa luminosidade solar de fim de tarde. Via-se o Sol, pintando as nuvens no horizonte, e o mar multicor, olhando-se muito profundamente, aos seus pés. Literalmente não andando com os pés no chão. A mesma mesa com o mesmo banquete, as mesmas cadeiras, as mesmas correntes, mas sentados as mesas, não mais os vultos enlouquecidos de fome, mas sim a pura representação da felicidade.
Cada um alimentava a pessoa sentada ao lado, contornando de forma altruísta os limites impostos pelas correntes, que agora nem se faziam mais precisas, e se afrouxaram ao ponto de libertar-lhes os punhos.
Laura então sentiu seus peitos dilatados e doloridos.
Querido, só hoje descobri como seguir as pessoas aqui no Blog!! haha Obrigada pelo comentário. Bjs
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